(in Brados do Alentejo)
A Casa da Cultura de Estremoz, num projecto apoiado pela Câmara Municipal e pelo Até Jazz Café, vai promover um Curso de Iniciação à Prática Teatral, que decorrerá durante o próximo ano lectivo no Teatro Bernardim Ribeiro.
As aulas, duas horas semanais (segundas-feiras das 21 às 23) com início já em Outubro, serão ministradas por Teresa Lima, professora de voz que já trabalhou com grupos de teatro em Estremoz e que é actualmente directora artística do grupo “O Bando”.
A iniciativa destina-se a pessoas com mais de 16 anos, com ou sem experiência, estando as inscrições (limitadas até um máximo de 20 participantes) abertas até dia 6 de Outubro.
Brados do Alentejo falou com Teresa Lima (T.L.), bem como com o presidente da direcção da Casa da Cultura, João Carlos Vieira (J.C.V.), para conhecer melhor os contornos desta nova proposta.
Brados do Alentejo: Que objectivos norteiam este Curso de Iniciação à Prática Teatral?
Teresa Lima: Este curso tem por objectivo fornecer os instrumentos mínimos duma prática teatral consciente, com reflexão. Muitas vezes, o problema dos grupos amadores e das pessoas que fazem teatro não profissional, é que por mais boa vontade que tenham faltam-lhe os instrumentos necessários para a representação. Ninguém se lembraria de pôr uma orquestra a tocar sem nunca ter praticado...
B.A.: Portanto, é um projecto que visa essencialmente a formação.
T.L.: Sim, formação durante um ano. No fim desse ano, quem estiver interessado poderá integrar o que nós chamamos o TAE, Teatro Amador de Estremoz, que será um grupo de teatro com algumas obrigações, com um horário mais rígido e que se calhar terá que movimentar-se fora de Estremoz para fazer espectáculos. Mas nesta fase não existe esse compromisso.
B.A.: Quer dizer, este primeiro ano não perspectiva a criação de um grupo de teatro, nem nenhum tipo de representação pública.
T.L.: Nada. É aprender a estar em palco e a representar. É um ano de trabalho.
B.A.: Dentro do curso, quais são os itens que irão ser explorados?
T.L.: Numa primeira fase, vamos fazer um trabalho de iniciação e sensibilização aos instrumentos do actor. Isto quer dizer que vamos trabalhar a voz, muito, porque eu acho que o grande problema dos grupos amadores é não saber falar. Tudo corre muito bem, mas quando abrem a boca percebe-se que há ali uma falta de técnica. Vamos trabalhar a voz e a comunicação vocal, comunicação em todos os sentidos, as emoções, os afectos, e vamos trabalhar o corpo no espaço cénico. Depois, numa segunda fase, vamos fazer um pouco de técnicas de improvisação, que é trabalhar a disponibilidade do actor, a sua capacidade de responder ao outro, de se concentrar, área em que alguns actores têm dificuldades. Depois, vamos fazer um terceiro trabalho, já mais profundo, que é a análise e construção de um personagem. Um actor não pode ser sempre o mesmo em palco, muitas vezes nas novelas a gente vê que os actores são sempre os mesmos, que não fazem nada de diferente. A personagem constrói-se através de uma oralidade, de uma interioridade e de uma corporalidade. É aí que o personagem se distingue do próprio actor. Na última fase, vamos interpretar texto, não como “eu actriz”, mas como “eu personagem”, como é que “eu personagem” interajo com os outros, que não são os meus colegas mas personagens também.
Professora há 20 anos
B.A.: Quem é a Teresa Lima, e qual a razão que a faz lançar esta aposta em Estremoz?
T.L.: Eu trabalhei em Estremoz há sete anos, durante dois anos, com o grupo de teatro daqui, e foi das experiências mais gratificantes da minha vida. Porque se criou entre mim e as pessoas uma ligação afectiva de tal maneira forte que me fez voltar ao fim de sete anos. Por razões pessoais fui-me embora, nunca pensei voltar ao Alentejo, e foi essa memória, dos risos, da intensidade com que foi vivido o nosso projecto, que me fez voltar.
Eu sou licenciada em Línguas e Literaturas, trabalhei como actriz, faço recitais de poesia... Há 20 anos que sou professora de voz e de texto em várias escolas de teatro em Lisboa e no Porto, e tenho trabalhado com todos os grandes encenadores deste país. Há sete anos que faço parte da direcção artística do grupo de teatro O Bando, que é um grupo que já está muito implantado, o que me permitiu não só pensar em teatro profissional, mas também no papel do teatro na sociedade. Estes sete anos deram-me a hipótese de pensar para que é que servia a minha profissão, para além de apresentar espectáculos. Eu acho que o teatro amador é muito mais que um núcleo de pessoas que apresenta um espectáculo de vez em quando. Acho que o teatro modifica as pessoas, transforma-as, pode ser um meio de ligação e de aceitação das diferenças. Eu acredito muito que o teatro transforma a sociedade, como o faz outra qualquer forma de arte.
B.A.: Para além deste projecto, a Teresa está envolvida num outro, também no Alentejo...
T.L.: Fui convidada pela Direcção Regional da Cultura do Alentejo para dar formação de voz a todo o teatro amador do Alentejo. Eu aceitei só no Alto Alentejo, vou dar formação a 11 grupos, sendo que cada grupo vai escolher duas pessoas que lhes pareça que são capazes de multiplicar depois a formação recebida. Como disse o Vieira, eu adoraria que Estremoz fosse um pólo fundamental no teatro amador neste país, e pedi para que a formação fosse no Teatro Bernardim Ribeiro. Vou começar essa formação em Outubro, e espero que a Câmara ceda o teatro para este projecto. Seria muito interessante, porque o próximo ano seria um ano raro de animação teatral em Estremoz. Não tanto na sua face visível, porque as pessoas iriam perguntar onde é que está o teatro, mas de formação, para que no futuro pudéssemos ser esse pólo do teatro amador no Alentejo e no país.
Recuperar a tradição
B.A.: Qual é a importância deste projecto para a Casa da Cultura de Estremoz?
João Carlos Vieira: Este projecto é lançado pela Casa da Cultura atendendo às experiências que teve num passado recente, e também à tradição do teatro em Estremoz. O objectivo, a médio e longo prazo, além dos enunciados pela Teresa, será criar em Estremoz um pólo no campo do teatro, como algumas cidades aqui em volta se estão a especializar em determinados outros ramos de cultura, como por exemplo Portalegre com o jazz e Montemor com a dança. Julgamos que, no contexto regional, o teatro tem um espaço vago e esse espaço pode ser ocupado por Estremoz, até pelas suas características geográficas, e porque dispõe de uma das mais bonitas salas de espectáculos da região, com todas as condições para se desenvolver um trabalho válido.
B.A.: Mas é de alguma forma um trabalho que prossegue projectos anteriormente lançados pela Casa da Cultura, como os grupos de teatro Lume de Chão e Pé Ante Pé, ou a iniciativa Teatrar?
J.C.V.: Não. Nesta fase consideramos esses projectos esgotados, por vários motivos. Inclusivamente muitas pessoas já não estão em Estremoz. Portanto, nesse sentido é uma ruptura com o trabalho anterior. Um grupo de teatro para Estremoz ou para a Casa da Cultura, se surgir surgirá daqui.
Pedro M. Pereira
A Casa da Cultura de Estremoz, num projecto apoiado pela Câmara Municipal e pelo Até Jazz Café, vai promover um Curso de Iniciação à Prática Teatral, que decorrerá durante o próximo ano lectivo no Teatro Bernardim Ribeiro.
As aulas, duas horas semanais (segundas-feiras das 21 às 23) com início já em Outubro, serão ministradas por Teresa Lima, professora de voz que já trabalhou com grupos de teatro em Estremoz e que é actualmente directora artística do grupo “O Bando”.
A iniciativa destina-se a pessoas com mais de 16 anos, com ou sem experiência, estando as inscrições (limitadas até um máximo de 20 participantes) abertas até dia 6 de Outubro.
Brados do Alentejo falou com Teresa Lima (T.L.), bem como com o presidente da direcção da Casa da Cultura, João Carlos Vieira (J.C.V.), para conhecer melhor os contornos desta nova proposta.
Brados do Alentejo: Que objectivos norteiam este Curso de Iniciação à Prática Teatral?
Teresa Lima: Este curso tem por objectivo fornecer os instrumentos mínimos duma prática teatral consciente, com reflexão. Muitas vezes, o problema dos grupos amadores e das pessoas que fazem teatro não profissional, é que por mais boa vontade que tenham faltam-lhe os instrumentos necessários para a representação. Ninguém se lembraria de pôr uma orquestra a tocar sem nunca ter praticado...
B.A.: Portanto, é um projecto que visa essencialmente a formação.
T.L.: Sim, formação durante um ano. No fim desse ano, quem estiver interessado poderá integrar o que nós chamamos o TAE, Teatro Amador de Estremoz, que será um grupo de teatro com algumas obrigações, com um horário mais rígido e que se calhar terá que movimentar-se fora de Estremoz para fazer espectáculos. Mas nesta fase não existe esse compromisso.
B.A.: Quer dizer, este primeiro ano não perspectiva a criação de um grupo de teatro, nem nenhum tipo de representação pública.
T.L.: Nada. É aprender a estar em palco e a representar. É um ano de trabalho.
B.A.: Dentro do curso, quais são os itens que irão ser explorados?
T.L.: Numa primeira fase, vamos fazer um trabalho de iniciação e sensibilização aos instrumentos do actor. Isto quer dizer que vamos trabalhar a voz, muito, porque eu acho que o grande problema dos grupos amadores é não saber falar. Tudo corre muito bem, mas quando abrem a boca percebe-se que há ali uma falta de técnica. Vamos trabalhar a voz e a comunicação vocal, comunicação em todos os sentidos, as emoções, os afectos, e vamos trabalhar o corpo no espaço cénico. Depois, numa segunda fase, vamos fazer um pouco de técnicas de improvisação, que é trabalhar a disponibilidade do actor, a sua capacidade de responder ao outro, de se concentrar, área em que alguns actores têm dificuldades. Depois, vamos fazer um terceiro trabalho, já mais profundo, que é a análise e construção de um personagem. Um actor não pode ser sempre o mesmo em palco, muitas vezes nas novelas a gente vê que os actores são sempre os mesmos, que não fazem nada de diferente. A personagem constrói-se através de uma oralidade, de uma interioridade e de uma corporalidade. É aí que o personagem se distingue do próprio actor. Na última fase, vamos interpretar texto, não como “eu actriz”, mas como “eu personagem”, como é que “eu personagem” interajo com os outros, que não são os meus colegas mas personagens também.
Professora há 20 anos
T.L.: Eu trabalhei em Estremoz há sete anos, durante dois anos, com o grupo de teatro daqui, e foi das experiências mais gratificantes da minha vida. Porque se criou entre mim e as pessoas uma ligação afectiva de tal maneira forte que me fez voltar ao fim de sete anos. Por razões pessoais fui-me embora, nunca pensei voltar ao Alentejo, e foi essa memória, dos risos, da intensidade com que foi vivido o nosso projecto, que me fez voltar.
Eu sou licenciada em Línguas e Literaturas, trabalhei como actriz, faço recitais de poesia... Há 20 anos que sou professora de voz e de texto em várias escolas de teatro em Lisboa e no Porto, e tenho trabalhado com todos os grandes encenadores deste país. Há sete anos que faço parte da direcção artística do grupo de teatro O Bando, que é um grupo que já está muito implantado, o que me permitiu não só pensar em teatro profissional, mas também no papel do teatro na sociedade. Estes sete anos deram-me a hipótese de pensar para que é que servia a minha profissão, para além de apresentar espectáculos. Eu acho que o teatro amador é muito mais que um núcleo de pessoas que apresenta um espectáculo de vez em quando. Acho que o teatro modifica as pessoas, transforma-as, pode ser um meio de ligação e de aceitação das diferenças. Eu acredito muito que o teatro transforma a sociedade, como o faz outra qualquer forma de arte.
B.A.: Para além deste projecto, a Teresa está envolvida num outro, também no Alentejo...
T.L.: Fui convidada pela Direcção Regional da Cultura do Alentejo para dar formação de voz a todo o teatro amador do Alentejo. Eu aceitei só no Alto Alentejo, vou dar formação a 11 grupos, sendo que cada grupo vai escolher duas pessoas que lhes pareça que são capazes de multiplicar depois a formação recebida. Como disse o Vieira, eu adoraria que Estremoz fosse um pólo fundamental no teatro amador neste país, e pedi para que a formação fosse no Teatro Bernardim Ribeiro. Vou começar essa formação em Outubro, e espero que a Câmara ceda o teatro para este projecto. Seria muito interessante, porque o próximo ano seria um ano raro de animação teatral em Estremoz. Não tanto na sua face visível, porque as pessoas iriam perguntar onde é que está o teatro, mas de formação, para que no futuro pudéssemos ser esse pólo do teatro amador no Alentejo e no país.
Recuperar a tradição
B.A.: Qual é a importância deste projecto para a Casa da Cultura de Estremoz?
João Carlos Vieira: Este projecto é lançado pela Casa da Cultura atendendo às experiências que teve num passado recente, e também à tradição do teatro em Estremoz. O objectivo, a médio e longo prazo, além dos enunciados pela Teresa, será criar em Estremoz um pólo no campo do teatro, como algumas cidades aqui em volta se estão a especializar em determinados outros ramos de cultura, como por exemplo Portalegre com o jazz e Montemor com a dança. Julgamos que, no contexto regional, o teatro tem um espaço vago e esse espaço pode ser ocupado por Estremoz, até pelas suas características geográficas, e porque dispõe de uma das mais bonitas salas de espectáculos da região, com todas as condições para se desenvolver um trabalho válido.
B.A.: Mas é de alguma forma um trabalho que prossegue projectos anteriormente lançados pela Casa da Cultura, como os grupos de teatro Lume de Chão e Pé Ante Pé, ou a iniciativa Teatrar?
J.C.V.: Não. Nesta fase consideramos esses projectos esgotados, por vários motivos. Inclusivamente muitas pessoas já não estão em Estremoz. Portanto, nesse sentido é uma ruptura com o trabalho anterior. Um grupo de teatro para Estremoz ou para a Casa da Cultura, se surgir surgirá daqui.
Pedro M. Pereira
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